Italy Divide 2022 — Terra Santa

O Italy Divide é um evento ciclístico com largada em Pompeia, Napoli, e chegada em Torbole, no Lago de Garda. São mais de 1300 quilômetros de extensão e 22500 metros de altimetria acumulada. Os terrenos são muito variados, do asfalto mais perfeito a trilhas fechadas, com direito a lama, cascalho e possibilidade de neve. Os ciclistas não recebem suporte externo. O relógio não para e cada participante é livre para se alimentar e dormir onde preferir.

A prova é uma não-corrida: a primeira pessoa a chegar não ganha prêmio nem título, mas é celebrada em postagens da prova nas redes sociais. O espírito incentivado pelo organizador Giacomo Bianchi é de aproveitar ao máximo o percurso que, todos os inscritos sabem, é muito belo e desafiador.

Minha história com o Italy Divide começa logo depois do Bikingman Brasil 2021, ou provavelmente antes. Em 2017 morei com minha família em Roma e em Lucca por um total de 5 meses. No ano seguinte moramos em Lucca mais uns 3 meses. Já na nossa primeira temporada italiana, eu e minha esposa Stefania compramos duas bicicletas simples, uma cadeirinha de criança e levamos nossa filha Olivia, então com 2 anos e meio de idade, por giros na Toscana.

Recém chegado em casa do Bikingman 2021, e muito frustrado por não ter conseguido completar aquela prova, abri o site do Italy Divide. Eu já vinha namorando o evento, e os detalhes da prova tinham acabado de sair. A combinação de local e data da largada atingiram minha alma em cheio: Pompeia, 23 de abril.

Pompeia é um dos lugares que mais me impactou em toda a vida. A beleza e preservação do passado, a sofisticação com que os habitantes viviam na cidade há mais de 2 mil anos, a arte, misturadas à tragédia expressa nas construções e principalmente nos famosos corpos mumificados vivos e transformados em esculturas assustadoras — eu não estava preparado para a magnitude daquilo e fiquei semanas bastante comovido. Eu vivia em Nova York durante a grande catástrofe ocidental deste século, o 11 de Setembro, algo que me deixou memórias muito intensas, e penso que associei mentalmente os dois eventos.

A data de 23 de abril é especial para mim porque é o aniversário do meu pai. Foi ele que, certamente sem querer, me introduziu ao ciclismo de longa distância. Eu tinha uns 11 ou 12 anos quando ele começou a me levar para pedaladas em dupla pelo bairro onde morávamos, a Barra da Tijuca. O trajeto de uns 14 quilômetros era imenso para mim, as aventuras marcantes e os momentos de parceria filho-e-pai, um presente. Muitos anos depois, quando comecei a viajar de bicicleta, meu pai ficou apavorado, mas aí já era tarde demais. Outros tantos anos depois, meu pai que havia me inspirado a gostar de bicicleta perdeu parte da visão. Lembro de um pedaço de conversa que tivemos depois, em que eu resmunguei sobre alguma falta trivial da vida, não poder comprar alguma coisa ou alguma bobagem semelhante, e ele comentou mais consigo mesmo do que para mim: “eu queria poder dar uma volta de bicicleta”.

Levei a preparação bastante a sério: passei a ser treinado pelo Nuno Lopes, técnico e ciclista com experiência de ultra distância em provas como a Trans Am Bike Race. Fiz consultas e um programa nutricional com o Rafael Brasilia, que acompanha atletas brasileiros de nível mundial. Troquei minha Cannondale Topstone por uma Specialized Diverge 2021, que comporta pneus mais largos, muito úteis para provas de bikepacking. Estudei e pratiquei manutenção na bicicleta, aumentando muito o meu repertório de reparos e ajustes. Fiz também algumas viagens usando o bivaque, uma espécie de mini-tenda de camping do tamanho de uma pessoa, para me habituar a acampar com o equipamento adequado.

Despedida.

Roma

Embarquei no Rio de Janeiro em 15 de abril, voando para Roma com escala em Paris. A mudança de avião seria rápida, eu tinha pouco mais de uma hora. Da minha parte deu tudo certo, e eu ainda consegui curtir a paisagem no vôo entre a França e a Itália. Ao desembarcar, não demorou muito para ficar claro que a minha bicicleta não tinha chegado ao destino. A empresa não conseguiu fazer a transferência da minha única peça de bagagem, com todo o meu equipamento, em tempo hábil.

Por sorte, e também graças ao aviso prévio do amigo Vinicius Martins de que um atraso de bagagem poderia acontecer, eu havia feito uma reserva para a primeira noite em um hotel próximo do aeroporto, na cidade de Fiumicino.

Apesar da frustração de não encontrar logo as minhas coisas, a comunicação com a companhia aérea foi eficiente e logo ficou confirmado que assim que o dia raiasse a bicicleta estaria no aeroporto. Sendo assim, decidi percorrer a pé os 3 quilômetros até o hotel, aproveitando um belo pôr-do-sol. Mesmo em um trajeto que não se pretende turístico, passei por algumas ruínas milenares e já comecei a sentir a alegria e a vibração de estar em um lugar tão especial.

Tomei banho e fui caminhar rumo ao centro de Fiumicino em busca de algo para comer. Encontrei um lugar agradável com muitas famílias locais, e ali comi uma Pinsa de pistache. Dizem que a Pinsa é uma espécie de precursora da pizza que conhecemos hoje, muito leve e com a massa um pouco inflada e macia por dentro. Ela, e mais uma garrafa de cerveja Ichnusa, tranquilizaram todas as minhas preocupações e me encaminharam para uma boa noite de sono.

Pinsa.

Acordei com calma, tomei o ótimo café da manhã do hotel (já adianto que ao longo deste relato eu não vou comer mal em momento algum, isso é uma tarefa muito difícil na Itália) e, novamente a pé, voltei para o aeroporto. Fui atendido com cortesia pelos funcionários, sempre me arriscando ao máximo no italiano que eu havia praticado ao longo de meses, com meu simpático professor Davide Rossi.

No último guichê, ouço da atendente que a caixa com a minha bicicleta me esperava do outro lado do grande saguão de bagagens. Um grande alívio me veio ao enxergar a grande caixa de papelão, e um estranho choque ao ver ao lado da caixa uma pessoa que parecia muito ser a minha tia Adriana, já falecida. Era uma senhora que cuidava da área, e a semelhança física era impressionante. Minha tia Adriana sempre foi a mais italiana dos membros da minha família, sempre usando expressões italianas mesmo sem, acredito eu, sequer ter ido à Itália. Quando eu era novo eu não entendia esse amor, para mim a Itália era o país que ganhou do Brasil na Copa de 82 e não um país ao qual eu pertencesse, mas esse meu sentimento se transformou em 2017 e 2018 por um grande amor à Itália. Portanto, encontrar uma sósia da minha tia ali me trouxe uma sensação de estar sendo abençoado naquela aventura, mais ainda quando ela sutilmente me encorajou a montar a minha bicicleta ali mesmo com toda a calma que eu precisasse.

Não sei quanto tempo levei, talvez uma hora ou mais. O fato é que consegui remontar a bicicleta inteira, encaixei todas as bolsas e aparentemente não sobrou nem faltou peça alguma. Uma façanha rara na minha carreira de mecânico.

Após o susto com o atraso da bike, tudo no seu devido lugar.

Saí do aeroporto com o Sol já alto e temperatura amena, talvez uns 20 graus. Na bicicleta eu notava apenas o câmbio um pouco desregulado e o freio dianteiro baixo demais. Sabia que meu pneu traseiro estava com câmara de ar, e não líquido selante, o que não seria ideal para a prova. Mas dava para seguir. Em alguns minutos, o caminho para Roma entrava em uma ciclovia que seguiria paralela ao rio dos rios, o Tibre, ou Tevere em italiano. O rio de Roma, o rio da civilização ocidental. A ciclovia era perfeita e deslumbrante, com belas ruínas e famílias passeando a pé ou de bicicleta naquele domingo de início de primavera.

Indo sem pressa, em cerca de duas horas eu estava na Roma que conhecia. Cheguei pelo Tevere, inclusive seguindo pela pista de esportes que margeia o rio em direção ao Vaticano, Trastevere e Piazza Navona. Depois de dois anos de pandemia, a mera possibilidade de viajar seria por si só uma alegria imensa. Naquele lugar então, eu ria sozinho.

Antes mesmo de ir para o meu apartamento alugado, almocei na Pizzeria da Baffetto (Pizzaria do Bigodinho), que tem uma extraordinária pizza ao estilo romano e ingredientes muito saborosos. Para minha grande honra, os garçons me reconheceram e não só autorizaram como pediram que eu guardasse a bicicleta no mítico depósito da Baffetto, um lugar levemente bagunçado mas que guardava, além de cerveja e refrigerantes, alguns séculos de História. A pizza foi a cereja do bolo e o apartamento que aluguei foi muito acima de todas as expectativas.

Pizzeria da Baffetto. Imperdível.

Passei dois dias e duas noites muito felizes em Roma. Eu trabalhei naquela semana, não foram dias de férias. O que fiz foi levar meu laptop para a rua e trabalhar de igrejas, calçadas, em frente ao Castelo Sant’Angelo, aproveitando o enorme privilégio de poder ser um nômade digital.

Piazza Navona.

Frosinone

Acordei às 4:30h da manhã da terça-feira, dia 19 de abril, para começar a pedalada rumo a Pompeia. Ao sair do apartamento, a luz do dia ainda não havia aparecido e a temperatura era de 7 graus. Pedalar com uma bicicleta gravel pelos paralelepídos característicos do centro histórico de Roma, deserto àquela hora, foi um breve delírio. Virei à esquerda na Via del Governo Vecchio, andei alguns quarteirões, logo à direita na pequena Via Sora onde morei em 2017, e poucos metros adiante outra esquerda na avenida Vittorio Emanuele. Em poucos minutos o céu já ganhava um tom mais claro e eu chegava em frente ao Coliseu. Ao fundo, baixa e quase cheia ainda, a Lua se encaixava no cenário.

Soninho, mas vamos que vamos.

Planejando o trajeto de Roma a Pompeia preferi não usar o percurso do Italy Divide, ainda que fosse no sentido inverso. A ideia era conhecer lugares diferentes, ao mesmo tempo usando um caminho menos desgastante já que a ideia era estar bem fisicamente para a prova. Escolhi um caminho pelo interior que passaria por Frosinone, saindo de Roma por uma estrada muito antiga, a Via Casilina.

A saída da capital lembrou a saída de qualquer grande cidade, passando por bairros de residências mais simples e antigas áreas industriais, ainda que em outra proporção se comparado a uma Avenida Brasil carioca. A Via Casilina é bastante urbanizada e parece mais outra avenida do que uma estrada. As primeiras horas de pedalada, portanto, envolveram muita atenção com o tráfego. O Sol subia e aquecia o ar, e fui removendo camadas de roupa. Parei para um café na altura da cidade de Laghetto. Pedi um cappuccino e ganhei um upgrade: uma taça daquelas de milkshake, transbordando. Saí feliz pelo carinho e por ter conseguido conversar com o atendente indiano de forte sotaque napolitano.

Sabendo que eu teria que trabalhar ainda naquele dia, não fui propriamente passeando. Segui em um bom ritmo pela Casilina até chegar em Frosinone na hora do almoço. Foram 93 quilômetros. Antes de procurar um hotel, passei em uma excelente loja e oficina, a Toni Bike. A princípio o proprietário e mecânico hesitou em me atender, a fila de bikes aguardando cuidados era visível e enorme. Ao perceber que se tratava de um cicloviajante, ele foi mudando de ideia. Depois que contei para ele que ia para o Italy Divide, ele parou tudo o que estava fazendo, instalou selante no meu pneu e regulou o câmbio da bicicleta com maestria. Eu começava a entender a paixão do italiano pelo ciclismo. Ele me cobrou somente 5 euros pelo serviço e ainda me deu um protetor contra o frio no pescoço e no rosto com os logotipos da sua loja, que eu usaria bastante na prova.

Fiquei no primeiro hotel razoável que encontrei, tomei um banho, abri o computador e trabalhei até a noite.

Pompeia

Acordei bem antes da quarta-feira clarear. Apesar do plano inicial de dividir o trajeto até Pompeia em pequenas prestações, a previsão do tempo dizia que no dia seguinte choveria bastante. Eu estava viajando com um laptop nas costas, e não poderia me arriscar a molhar minha mochila. Decidi pedalar até Pompeia naquele dia mesmo. Ainda no escuro, eu estava de volta à via Casilina seguindo rumo ao sul.

Fui me aproximando do litoral em um percurso que teve boas paisagens. O trajeto criado pelo Google Maps me levou por estradinhas de terra bloqueadas e pontes em que tive que empurrar a bike. Não foi muita coisa, foi divertido e foi bonito. Quando cheguei no litoral, a verdade é que não passei quase tempo nenhum à beira-mar, e sim em uma estrada paralela às praias. Passei por cidades como Mondragone, já na região da Campania, conhecida pela criminalidade até não muito tempo atrás. Dizem que para entrar lá as pessoas tinham que pagar pedágio para a turma local. Não me pediram absolutamente nada e a cidade também não mostrou charme nenhum, apenas uma sequência de lojas e restaurantes na avenida.

O Google Maps propiciou caminhos interessantes.

A hora do almoço não estava longe quando comecei a me aproximar de Napoli. O trajeto previsto daria a volta bem por dentro da cidade. Para mim esse caminho parecia bom, porque seria diferente do que eu faria em sentido oposto no Italy Divide. Eu estava em um trecho muito plano, com ruínas e grandes áreas que pareciam ser de cultivo, porém sem nada plantado naquele momento. Depois de uns 30km assim, a cidade começou a se montar. Primeiro galpões, depois algumas fábricas pequenas, em algum momento uma birosca, até tudo se transformar em uma avenida. Passei por muitos africanos de bicicleta também. Não pude deixar de notar que alguns motoristas eram muito grosseiros com os africanos, buzinando e tirando finas. A verdade é que o racismo existe com força na Itália, algo que eu já sabia, havia testemunhado de outras formas, e lamento muito.

Zona rural a norte de Napoli.

Ainda na entrada de Napoli, parei em um bar. O conceito de bar na Italia é muito diferente do bar no Brasil. Na Italia, bar é onde se toma café e faz pequenos lanches. É possível fazer uma fézinha em um caça-níquel eletrônico nos bares mais rasteiros. Comi uma pizza barata, enchi as garrafas e não fiz fé nenhuma.

Poucos quilômetros depois emparelhei com uma ciclista usando todo o equipamento de quem pedala a sério, inclusive uma bela bicicleta Bianchi de estrada. Embaixo do selim ela tinha uma bandeirinha de arco-íris, que por lá poderia simbolizar simpatia LGBT, apoio à Ucrânia contra a Rússia, ou talvez até uma mistura das duas coisas. Em movimento ela me perguntou de onde eu vinha e para onde eu ia. Disse que de Roma para Pompeia. Falei do Italy Divide. Ela parecia saber da prova, e me disse entusiasmada que já tinha feito essa viagem de bike até o norte da Itália, e que tinha gostado muito. Ela ofereceu de me guiar por uns 10km por um caminho mais bacana e fora das autoestradas. Aceitei e de fato fomos por uma vicinal que chegou no centro pelo alto da cidade, oferecendo um visual bem bonito. Nos despedimos conversando mais um pouco. O nome dela era Imma, ela gosta de fazer longas distâncias e eventos randonneur pela Itália—inclusive faria um brevet Napoli-Roma-Napoli de 400km no sábado seguinte. Trocamos Instagram e segui em frente.

A Imma me guiou por Napoli.

Napoli é uma cidade de extremos que me lembra muito o Rio de Janeiro. Mar e morros, uma baía, problemas sociais, crime e muito charme e calor humano. Na outra vez que estive em Napoli entramos na cidade por outro lado. Desta vez, desci para a baía passando por um lindo parque e depois uma avenida de paralelepípedos cheia de construções antigas e muito bem conservadas. Foi maravilhoso. O trânsito caótico napolitano é celestial se comparado ao carioca. Acabei chegando na estação de trem, virei à esquerda e cheguei na zona portuária do Rio. Sim, era a de Napoli. Mas ambas são iguais.

Apenas segui em frente e a cidade foi acalmando um pouco. Em meia-hora eu cheguei a Herculano, cidade já próxima a Pompeia e que também foi completamente devastada junto com a vizinha mais famosa. A bem da verdade, em alguns lugares eu pedalei por terra que foi criada pela própria erupção do Vesúvio há 2000 anos, e que antes era mar. Já eram umas 16 horas quando cheguei ao Camping Zeus, onde eu me hospedaria até o sábado, e onde a prova largaria. O conceito de camping na Italia e na Europa geralmente inclui uma estrutura para motor-homes: banheiros limpos com chuveiros, máquinas de lavar e secar, e frequentemente quartos de verdade para quem quiser algo mais convencional. Eu já vinha com reserva para um quarto, e nele entrei depois de quase 170km pedalados. Tomei banho, comi alguma coisa e abri o computador para trabalhar.

O Vesúvio. Elevação: 1281m.

Os dois dias seguintes foram de descanso, lavanderia, trabalho e alguns passeios por Pompeia. A visita à Pompeia histórica foi tão impactante quanto da primeira vez. Ali existem muitas construções de gigantesca importância e utilidade para entendermos nossa origem. O anfiteatro muito bem preservado é apenas um dos lugares famosos de lá, e onde fiquei um bom tempo desta vez. Ao mesmo tempo, pensar e sentir aquela catástrofe não é algo simples. Um certo peso foi batendo na alma.

De volta ao camping, fui encontrando outros participantes do evento. Os primeiros que cumprimentei, logo na chegada, foram os americanos Gary Johnson e Nelson Carter. Ambos estavam na casa dos 60 anos, o primeiro bastante alto e forte, o segundo não tão alto e mais magro: o biotipo do ciclista. Muito simpáticos, eles me contaram que pretendiam fazer a prova o mais devagar possível, aproveitando ao máximo a viagem. Eu comentei que pensava da mesma forma, e imaginava completar o percurso em 6 dias. Eles riram e avisaram que o plano deles era de terminar em até um mês. Aí eu ri também. E ainda riria mais, uma semana depois.

Esse é o espírito do Italy Divide. Não há tempo limite para os participantes cumprirem o trajeto e serem considerados “Finishers”. Eu ainda entenderia muito mais detalhes sobre o espírito da prova, que no fundo reflete o jeito de ser do Giacomo Bianchi, criador e organizador de tudo aquilo.

Na noite anterior à largada haveria uma pizza e refrescos no restaurante do camping, reunindo os participantes. Tendo trabalhado até tarde para entregar tudo o que pudesse antes de entrar de férias, cheguei no restaurante já depois das 21 horas. Todas as mesas estavam lotadas. Era bastante gente, umas 200 pessoas. Talvez transferindo para o jantar o desencaixe que vinha sentindo no trabalho, fui jantar sozinho na cidade, voltei e dormi cedo.

Pompeia: só indo mesmo pra entender.

Dia 1: Pompeia — Scauri

O dia amanheceu ensolarado e agradável. No café da manhã mais uma vez se via a proporção do evento, muito maior do que todos os outros que eu havia participado até então. Dividi mesa com Gary e Nelson. Fiquei sabendo que o Gary era relativamente novato em eventos de longa distância, e estava apreensivo. Já o Nelson tinha anos de experiência com cicloturismo e competições, e estava bastante tranquilo.

Voltei ao quarto para fazer as últimas arrumações na bicicleta, separando também uma mochila que iria no caminhão dos organizadores até a chegada. Meu quarto era no térreo e tinha uma varanda que se comunicava com as varandas de outros quartos. Fazendo meus ajustes na varanda, conheci meu vizinho: Marin de Saint-Exupery. Ele perguntou sobre as minhas expectativas, e falei para ele da minha vontade de aproveitar o trajeto com calma e completar em 6 dias. Lembro de ter falado que quando fizesse esta prova pela terceira vez, aí sim ia querer competir — de onde essa ideia saiu, eu não sei até agora. Marin me contou que trabalha como courier ciclístico na Suiça, já tinha feito diversas provas de ultra distância e largaria para vencer em 3 dias. Falei que torceria por ele, e algo me disse que ele não estava iludido.

A largada que estava prevista para as 11 da manhã foi se atrasando. Um oceano de ciclistas conversava e tomava café ou apenas descansava aguardando. A grande maioria das bicicletas era gravel, mas se via mountain bikes também, de todas as marcas que se pode imaginar.

Já era 12:20 quando Giácomo começou sua preleção. Ele recomendou cuidado com o trânsito napolitano, que aproveitássemos ao máximo o percurso, e repetiu seu leitmotif sobre o evento: “[sic] Is not a race! (não é corrida!)”. Ao final, ele recomendou que não atravessássemos os Apeninos à noite, a não ser que fôssemos o Jay Petervary (famoso ultraciclista que mora no gélido Idaho e já venceu o Italy Divide, para não falar de provas no Alasca). Eu nem sabia o que eram os Apeninos, e em rápida busca no celular concluí que era o trecho entre Florença e Bolonha. Ainda tinha chão até lá.

A largada já tinha sido dada, mas na rabiola ainda tinha trânsito.

Era pouco mais de meio-dia e meia quando finalmente largamos. Saí mais para o final do imenso comboio. Viramos à esquerda saindo do camping e margeando à direita as escavações históricas de Pompeia, numa grande emoção. Nem 300 metros mais tarde, viramos à esquerda. Quem como eu estava na traseira do pelotão foi surpreendido pelo semáforo sinalizando a passagem de um trem. Ficamos para trás e “perdemos” uns 3 minutos esperando o sinal ficar verde. A verdade é que nunca mais eu alcançaria ninguém que havia passado antes do trem.

Os primeiros 15km são urbanos. No começo um bloco de dezenas de participantes, misturando festa e nervosismo. Em seguida a estrada de asfalto começa a apontar para cima, e segue com uma inclinação suave por alguns quilômetros. Todos ali já sabiam: aquilo era o pé do Vesúvio. No quilômetro 20 a subida fica séria. No início ainda ficamos no asfalto, mas em pouco tempo o trajeto vira um parque, e a estrada passa a ser de terra. Lembro de andar próximo a algumas pessoas com quem eu pouco conversei ali, e que mais tarde reencontraria. Vou aprendendo que, ao menos para mim, os inícios de eventos longos são momentos de ficar mais em silêncio, processando a adrenalina e a antecipação do que está por vir.

A subida do Vesúvio tem 8km de extensão e ganho de quase 900 metros em altitude. Não seria nada demais se não se tratasse do Vesúvio, com sua História e cinzas vulcânicas de muitos centímetros de profundidade. A estrada vai ficando cada vez mais solta até que não resta alternativa a empurrar a bike. Eu tentei pedalar o máximo possível enquanto quase todos estavam empurrando a bike. A bem da verdade, ao longo dessa prova recalibrei minha relação com empurrar a bike, aceitando muito melhor que empurrar pode ser uma ótima ideia.

O cenário vai ficando mais árido conforme subimos. A vegetação vai perdendo árvores, e aquelas que sobram ainda estão peladas do inverno. Só chegando no topo pudemos ver um pouco de Sol novamente, atrás de um pesado mormaço.

A descida começa antes de chegarmos à cratera, e o cenário muda rápido. Logo avistamos a Baía de Napoli e a grande cidade, tudo muito bonito. Este lado é todo asfaltado. Uma parada no mirante para absorver o visual e ser ultrapassado por múltiplos “adversários”, depois completo o mergulho.

O trajeto do Italy Divide é todo desenhado para percorrer os lugares mais bonitos do país e de cada cidade que cruzamos. Napoli abre os trabalhos sem economizar: passamos pelo Palácio Real, pelo Castelo Novo e pela Piazza del Plebiscito, que lembra muito a entrada do Vaticano. À esquerda, o mar. Uma rápida parada em um supermercado, compro umas fatias de pizza, água e suco. Seguindo entro na Baía de Pozzuoli, depois uma subida no Monte di Procida e outro visual estonteante: o Vesúvio ao fundo, atrás das duas baías que percorri.

O Vesúvio no horizonte, mais à esquerda.

Descendo o Monte di Procida começa o primeiro dos dois grandes trechos planos da prova. Seguimos o litoral da Campania rumo ao norte, pelo asfalto. A tarde caía e o pedal rendia bem. No começo estive com vários participantes. Notei que muitos seguiam em pequenos pelotões ou em duplas, como numa prova de ciclismo de estrada em que um atleta quebra o vento do outro. Em quase todos os eventos de bikepacking, no modo solo é proibido pedalar próximo. Aos poucos fui entendendo que essa prova era bem livre, inclusive em relação ao caminho.

Esse foi o único trecho sem grande interesse a cada quilômetro de toda a prova, mas também foi o único em que o pedal rendeu bastante.

Já próximo das 21h cheguei a Scauri, uma das primeiras cidades litorâneas do Lazio. Eu carregava um saco de bivaque e colchão de ar para dormir acampado se fosse necessário, mas preferia dormir em pousadas ou hotéis todas as noites para descansar bem e aproveitar ao máximo a viagem, evitando sacrifício a não ser o de algumas horas de sono.

Sem reserva em pousada, perguntei aos moradores onde poderia dormir e toquei em um albergue minúsculo, na verdade uma casa. Lá dentro, no escuro, vi dois participantes do Italy Divide. Eles mal falaram comigo, a não ser para informar que eles tinham feito reserva e aquele era o único quarto. Ouvindo o diálogo, uma vizinha se ofereceu para me ajudar e sua mãe insistia amavelmente para que eu entrasse e tomasse um café com elas. Eu imaginava como estaria fedendo àquela hora e o quanto eu não queria tomar café justo na hora de dormir. E a senhora se comunicava comigo em um dialeto, misturado a uma dificuldade de fala da idade provecta, mais a minha cognição prejudicada pelos 150km que eu havia pedalado até lá. Ela era muito amável, mas segui para um Albergo Aurora.

No hotel, o atendente me encaixou em um quarto de funcionários sem janela, porém limpo. O preço: 80 euros. Apenas mais uma vez em que fui roubado nesta vida, mas foi o preço que paguei por não querer me travar no planejamento e pela pouca experiência na empreitada. Tomei banho e fui jantar no restaurante mais próximo: salada, um enorme prato de macarrão e uma cerveja.

Voltei para o hotel perto das 23h, coloquei o despertador para as 4, mandei uma rápida mensagem para a família e para o Nuno, e desmaiei.

Dia 2: Scauri — Velletri

Acordei no primeiro toque do despertador. Abri o celular e vi as respostas do Nuno. Nada extremamente específico, um misto de lembretes importantes sobre gestão da mente/tempo/corpo e encorajamento, este último o mais importante de tudo. Boa parte da razão de ter o Nuno como técnico era mesmo ter alguém me encorajando: na minha família ninguém me apoiava muito nessa ideia, mais preocupados que eu permanecesse vivo.

Saí do quarto e vi duas bicicletas de cabeça para baixo no saguão do hotel. Pelas placas da prova eram dois austríacos. Ainda estava escuro quando subi na bicicleta e comecei o segundo dia.

Em menos de meia hora eu havia entrado em uma área mais rural. Com o dia querendo amanhecer, vi atrás de uma casinha antiga alguém brotando de seu saco de bivaque. Faz lembrar uma borboleta saindo do casulo. Sem dúvida era alguém da prova, até pela bicicleta. Ele não estava muito perto, e claramente havia tentado escolher um lugar discreto para dormir, então apenas segui em frente.

Voltando para a estrada principal, quase chegando em Sperlonga, encontrei uma lanchonete aberta. Entrando, vi mais dois participantes já tomando seus cafés. Eu tinha ficado perto deles em vários momentos no dia anterior, mas não tinha conversado e nem reparado muito em quem seria. Para minha surpresa, agora com um deles sem capacete, vi que era o Massimo Muttoni, o único italiano a vir para o Bikingman Brasil 2021 e que completou aquela prova durante a festa de celebração, sendo aplaudido por todos. Acabou sendo um café da manhã bem alegre. Fiquei conhecendo seu amigo Alex, de Saiano—cidadezinha na Lombardia que, dizem alguns familiares, me legou o sobrenome.

Reencontrando o Massimo no café da manhã em Sperlonga.

Com o Sol aparecendo, toquei em frente. Ainda de manhã comecei uma subida duríssima: o Circeo. É uma falésia em que chegamos a 400 metros de altitude, frente a um mar muito azul. Não é tão alto assim, porém a estrada é um rio de pedras enormes e soltas em curvas de nível muito acentuadas. Hora de empurrar e muito. Sorte que o dia estava lindo.

O Circeo.

A travessia levou boa parte da manhã. Depois eu soube que muita gente “bivacou” nessa subida na noite anterior — só imagino o frio, mas o visual devia estar excelente. Na descida passamos pelo primeiro trecho de trilha fechada, terra e lama da prova. Era um dos diversos bike parks que atravessaríamos, onde as mountain bikes se saíam bem melhor do que as gravel. O Italy Divide tem muitos trechos de mountain bike de verdade, diferente de um Bikingman Brasil ou dos brevets mistos que temos no Brasil, que apesar das grandes dificuldades são feitos de estradas mais pedaláveis.

Árvores caídas fractalmente no começo da descida do Circeo. Depois piora.

Quem não é bom de mountain bike tem que ir tocando as trilhas com calma e paciência. É o meu caso. São trechos que podem ser muito divertidos, ou um suplício, dependendo de como está nossa cabeça. Consegui me divertir, mas sempre com bastante cuidado para não bater o câmbio em uma pedra ou acabar com minha prova de algum jeito mais criativo.

Concluído o bonito parque, estamos de volta à beira-mar. Debaixo de Sol forte, o trajeto segue pela avenida da praia até um desvio para a direita em Sabaudia. Já estavamos na província de Latina. Essa área pantanosa foi drenada sob ordens do ditador fascista Benito Mussolini em 1933, e a cidade construída ali. A arquitetura é muito diferente do resto da Itália, e bem característica do fascismo italiano: caixotes sem nem um vestígio de charme. Já era uma da tarde e almocei uma salada com tiras de carne na praça central. Fiquei imaginando o que as pessoas dali pensavam de morar num lugar tão associado ao fascismo. Claro, não tive coragem de perguntar.

Saindo da cidadezinha, vi um “alimentare”: uma vendinha. O senhor me disse que a mozzarella estava esplêndida, que por ali haviam ótimas fazendas de búfalas. Convém acreditar nessas pessoas. Levei duas, mais umas 8 “clementines”, pequenas tangerinas que estavam na época. A mozzarella legítima, italiana, é tão diferente das que comemos no Brasil quanto as pizzas napolitanas são diferentes das que comemos no Rio de Janeiro. É como comer uma feijoada no Cacique de Ramos depois de uma vida comendo feijoada na Groenlândia. As bolas de queijo, do tamanho de uma maçã, vêm em um saco de plástico com água e ficam muito úmidas e macias. A mistura de líquido, sal, carboidrato, proteína e efeito placebo deu grande energia. As clementines hidratavam também, e alegravam a tarde ensolarada atravessando um lindo bosque por estradas de cascalho.

Depois de atravessar alguns lagos, chegou a hora de me despedir do litoral. Uma parada no pier de Capoportiere, um adeus ao mar, e segui perpendicularmente à costa. Atravessei Latina e comecei a subir: primeiro foi Norma, uma das muitas e maravilhosas cidades medievais (ou anteriores a isso) em cima de serras e morros. Essa subida foi longa, e nela vi diversos participantes da prova. Passado o nervosismo da largada, as pessoas davam os primeiros sinais de querer se comunicar. Diferente do Brasil, ali as pessoas pareciam mais reservadas, talvez pela variedade de línguas e culturas. Chegando a Norma, parei em uma loja de conveniência e conversei um pouco com o Michal, da República Tcheca. Ele parecia muito bem, mas sofrendo um pouco com o calor. A cidadezinha era muito bonita, mas a ideia era seguir bem mais, ainda que eu não tivesse ideia até quando ou onde.

Dessas búfalas vem a melhor mozzarella do mundo.

Seguimos até Cori, e uma francesa me perguntou onde eu iria dormir aquela noite. Falei que não sabia. Ela falou que tinha reserva em Velletri. Anotei o nome mentalmente, e olhando o mapa me pareceu um bom ponto para não dormir tarde. Outros ciclistas que cruzei falaram o mesmo.

Cori está lá em cima da serra.

A noite veio chegando e o tempo foi ficando fechado. Estávamos a uma altitude de 500m. Não é muito, mas o clima tinha mudado. Começou a esfriar com o cair do Sol. Em um dado momento, perguntei para algumas pessoas na estrada a quantos quilômetros eu estava de “Velétri”. Ninguém me entendeu. Depois de um tempo, um deles falou: “Ah, Velêtri? Uns 10 quilômetros.”

Cheguei a Velletri com um resto de luz do dia. É uma cidade com a parte baixa e a parte alta, sendo a parte alta o centro histórico. Ainda na parte baixa, parei em um supermercado e comprei lanches para comer no quarto da pousada e nem precisar sair para jantar.

Ao chegar na parte alta, vi alguns participantes da prova em um café, comendo ou tentando resolver pouso para a noite. Conheci uma dupla da Inglaterra, pai e filho, que falaram que iriam para um hotel bem lá no alto da cidade, e que teria vaga. Tom, de 66 anos, e Oliver, de uns 30 e poucos. Começava a chover e fui sozinho. Chegando lá, o hotel era espetacular, com um restaurante sensacional. Tom e Oliver chegaram logo depois. Tom falou que roncava muito e perguntou se eu queria dividir um quarto com o Oliver. Para mim estava bom: era uma economia. Acabamos dormindo na mesma cama, algo muito comum em eventos de longa distância, e extremamente tranquilo já que todos estão semimortos mesmo, ninguém se mexe.

Eles desceram para jantar, estavam em modo curtição extrema. Eu tinha que estar de volta a Roma 8 dias depois da largada para encontrar com minha família, e ia percebendo que eu até que estava apressado, na comparação com a turma. Sendo assim, comi um pouco do que tinha comprado, tomei um banho, lavei as roupas, organizei as coisas, falei com a família, mandei uma atualização para o Nuno e fui dormir tendo curtido muito esse primeiro dia inteiro de prova.

Tom e Oliver na recepção do hotel.

Dia 3: Velletri—Viterbo

Acordei às 4 da manhã. Para não incomodar o Oliver, saí do quarto e fiz os preparos para o dia em uma área no térreo do hotel. Fiquei um bom tempo perdido até encontrar a bicicleta, que na Itália eles nunca permitiram que ficasse no quarto comigo.

Havia diversas bicicletas da prova junto com a minha, certamente mais de dez. Montei minhas sacolas na bike, ouvi as mensagens do Nuno e saí ainda com o escuro da noite, descendo tudo o que eu havia subido da cidade para o hotel.

Hoje era dia de passar por Roma. Antes da prova, eu imaginava dormir muito perto de Roma na segunda noite, talvez depois de Roma até, mas não foi bem assim que aconteceu. Antes eu precisaria atravessar uma área, e um parque, chamados Castelli Romani.

Agora o mountain bike foi sério. Um trecho de pouco mais de uma hora, e com a trilha molhada da chuva ao longo da noite. Felizmente o caminho não estava encharcado, e pude pedalar tudo. Subidas inclinadas e curtas me fizeram suar mesmo no frio e na névoa do amanhecer. Já com um pouco de luz do dia, cheguei a Nemi, a menor vila dos Castelli Romani, e um lugar de imenso charme. Dizem as lendas que Nemi compartilha misteriosas coincidências com a cultura Celta. O bosque no entorno do vilarejo, o mesmo que eu acabara de cruzar, guardaria propriedades mágicas e sagradas. Isso eu fui saber muito mais tarde. Naquele momento apreciei por alguns instantes a vila ainda deserta, parado em uma fonte, enchendo minhas garrafas de água.

Fonte em Nemi.

Lamentando não ter todo o tempo do mundo, e não ter coragem de abandonar tudo e me radicar em Nemi, segui em frente. Voltei a uma estrada de terra, desta vez mais aberta e plana. Vi dois ciclistas me alcançando. Eram o Massimo e o Alex, eles realmente estavam indo juntos. Eles me contaram que também tinham dormido em Velletri. Indo num bate-papo, logo vimos o Lago Albano e chegamos a Castel Gandolfo. Esta cidade é quase um entreposto da Igreja Católica. O Papa tem uma espécie de casa de campo ali, e vemos muitos imóveis com a bandeira amarela e branca do Vaticano. O lugar é muito bem cuidado, até mesmo para os padrões italianos, e a vista do lago a partir da cidade é memorável.

Tomamos um café da manhã ao lado da praça central, cappuccinos com folheados e um sanduíche de porchetta talvez um pouco prematuro dado o horário, se fôssemos pessoas normais e não viajantes consumindo 9000 calorias por dia. O Alex contou histórias de Saiano, e ambos falaram um pouco de como se conheceram em uma edição passada do Italy Divide e desta vez combinaram de ir juntos.

Agora era hora de entrar em Roma, e através de nada menos do que a Via Appia Antica. A bem da verdade, nós já tinhamos percorrido bons trechos da Via Appia desde a largada, já que ela começa em Brindisi, quase na ponta do salto da bota que é o mapa italiano. A Via Appia talvez seja a estrada mais histórica do Ocidente, ligando o sul do Mediterrâneo a Roma desde antes de Cristo. A entrada para Roma guarda muito da sua forma de milênios: diversas ruínas, museus, sepulturas, catacumbas, e o calçamento com pedras gigantescas para os padrões atuais.

A sensação de estar em uma viagem no tempo era bem forte. Parei muitas vezes, curti as ruínas, a vegetação, as pedras do pavimento, as pessoas que passeavam ali também. A única coisa que me preocupava era meu freio dianteiro, que já vinha rateando desde a chegada na Itália. Nas descidas da manhã, ele simplesmente parou de funcionar.

Certamente em Roma eu encontraria um mecânico para olhar aquele freio. Só um detalhe poderia atrapalhar: era feriado naquela segunda-feira, era o Dia da Liberação (do Nazifascismo). Era por isso que havia tanta gente passeando em plena segunda-feira. Uma vez dentro da cidade, perguntei para um ciclista local se ele saberia de algum mecânico trabalhando naquela manhã. Ele respondeu categoricamente que eu não encontraria ninguém. Eu ainda tinha o freio traseiro, e aquele dia não tinha previsão de grandes descidas. Acreditei no romano e não investi na busca de uma oficina.

Roma foi uma sequência de cartões postais: Coliseu, Circo Massimo, Tevere, Castel Sant’Angelo, Vaticano. Mesmo já tendo visitado esses lugares algumas vezes, é especial chegar de bicicleta. Difícil encontrar uma cidade mais bonita que Roma.

Castel Sant’Angelo.

O feriado fez da saída de uma Roma uma gincana. As avenidas na beira do Tevere estavam todas fechadas para um desfile. Inventei um caminho paralelo até o Foro Itálico, passando por uma avenida expressa sem acostamento, na contramão. Fui bastante xingado pelos motoristas.

Finalmente cheguei à ciclovia que beira o rio e me levaria para o Norte. A cidade rapidamente vai ficando sossegada, e os prédios vão dando lugar a gramados imensos no entorno. Atravessei bairros e depois cidades do Lazio, pedalando no asfalto plano que rendia bem.

Era começo da tarde, e recebi mensagem do Brasil: meu Clube de Investimentos tinha recebido o ok da CVM e da corretora para começar a funcionar. Eu já estava esperando por essa notícia havia uns 2 meses. Motivo de comemoração, é claro. Porém, de acordo com as leis, eu e 2 cotistas teríamos que fazer nossos depósitos iniciais naquele dia mesmo.

Não sem motivo, minha memória sobre os lugares em que passei nas horas seguintes é vaga. Lembro mais de ficar pedalando e telefonando para o Brasil para coordenar tudo. Agradeço ao meu irmão Rodrigo e à minha esposa Stefania por ajudar. Me recordo de ter passado por um grande rebanho de ovelhas, pelo centro de treinamento do time da Lazio, por um desvio em um lindo bike park à beira de um rio, e a contínua transição da paisagem para algo mais rural e com as primeiras colinas subindo.

Deu tudo certo com a abertura do Clube de Investimentos, e o pedal estava indo igualmente bem.

O dia foi caindo com uma lentidão que não existe nas nossas latitudes. Ainda com a luz do Sol, em um sobe-e-desce até raro para aquela tarde, um grande susto: em uma descida na sombra, o piso estava cheio de limo. Eu estava rápido, e só tinha o freio traseiro. Uma derrapada e tanto antes de uma curva fechada. Muita adrenalina no sangue, e felizmente nada mais. Eu precisaria resolver aquele freio logo, porque as subidas estavam recomeçando.

Passada uma estrada de terra ao anoitecer, onde vi cavernas e porcos-espinho, cheguei na cidade de Viterbo. Era uma cidade de maior porte, com uns 70 mil habitantes. Estava de bom tamanho para aquele dia. Encontrei um hotel Best Western, daqueles bem padrão, e logo ao entrar vi bicicletas de outros participantes da prova. Nunca deixa de impressionar que, por mais que haja centenas de cidades e quilômetros no trajeto, sem combinar nada os ciclistas acabam tomando as mesmas decisões.

Ainda era cedo e pude jantar com toda a calma do mundo. Fui a um restaurante ao lado do hotel e jantei com direito a uma cerveja grande. Fiz chamadas de video com a família dali mesmo. Comi um tiramisu de sobremesa.

Já saindo do restaurante, vi em uma mesa três caras que obviamente estavam no Italy Divide: imundos e destruídos. Destes, eu só tinha visto um americano logo antes da largada: ele estava desesperado consertando a bike que tinha quebrado no vôo. Trocamos impressões sobre tudo até aquele ponto, e soube que os outros dois, um italiano e um tcheco, também já tinham participado da prova antes.

Comentei sobre meu freio, e que ainda não havia decidido se esperava alguma loja abrir ali mesmo em Viterbo, ou se sairia bem cedo sem freio dianteiro para ganhar tempo, e buscaria uma oficina mais na frente em horário comercial. O americano, de nome Azubuike, me encorajou a esperar ali em Viterbo mesmo, usando o ditado “uma bike consertada é uma bike rápida”. Ele estava bebendo, eu estava levemente ébrio da minha cerveja, e achei que ele falou com sabedoria. Eu ia resolver esse freio em Viterbo mesmo.

Dia 4: Viterbo—San Quirico d‘Orcia

Acordei tarde: 5:30 da manhã. Agora eu já abria os olhos sozinho às 4. Meu sono durante essas pedaladas longas pode ser um desmaio total, ou a noite inteira de sonhos febris, com imagens misturadas e confusas. Aceito o sono que vier, e até esse ponto eu estava conseguindo dormir todas as noites em boas camas. Eu sentia uma grande sede durante a noite, acordando duas ou três vezes com a boca seca e a língua colada. Bebia de um a dois litros de água, e depois comecei a comer um pouco de sal também durante a madrugada. Isso tudo, mesmo tomando muita água durante o dia. A Itália é bem seca se comparada ao Rio de Janeiro. Ao beber água, eu sentia o líquido voltando até para os meus olhos. Após bilhões de anos de evolução, nós continuamos esponjas.

No café da manhã encontrei os três do jantar: Azubuike dos EUA, Francesco da Italia e Jan (ou talvez Ian), que acho que vinha da República Tcheca. Eles também decidiram esperar uma oficina ali em Viterbo. Logo apareceram Tom e Oliver também. Tom me disse que precisou de um mecânico em Roma, e não teve problema nenhum em encontrar alguém no meio do feriado.

Com algum tempo até que as oficinas abrissem, o café da manhã rendeu.

Toquei o barco para o Laboratorio Cicli Tomi, um lugar bem avaliado na internet. Chegando lá, fui recebido pelo próprio Tomi. No dia anterior já tinham passado outras pessoas do Italy Divide por lá. Não foi necessário pedir prioridade, Tomi sem hesitar colocou minha bicicleta no suporte e perguntou como poderia ajudar. Conversando comigo e com outro senhor que já estava por ali, Tomi fez a sangria do óleo de freio mais outros pequenos ajustes na bike. Nesse meio tempo fiquei sabendo que o irmão de Tomi havia vencido uma Clássica de Primavera, que a família toda era do ciclismo havia 3 gerações, e que a Tomi tinha uma linha própria de bikes. Essa relação de gerações com o ofício é relativamente comum na Itália. Algumas dessas oficinas crescem muito, como a Pinarello e tantas outras. Muitas marcas italianas são oficinas cujas bikes se tornaram populares. Outra coisa comum é as pessoas já terem ido ao Brasil, gostarem do Brasil, e gostarem de conversar sobre o Brasil. Diferente por exemplo dos americanos, para quem o Brasil normalmente é algo desconhecido, para os italianos o Brasil frequentemente é um paraíso, ou ao menos um lugar que eles gostam.

Tomi.

Já eram 10 da manhã quando saí do Laboratório do Tomi. A bike estava boa novamente. E o caminho, que já estava muito bonito, extrapolaria os limites do maravilhamento.

A próxima cidade foi Montefiascone. Parei em um bar que, por fora, parecia algo muito simples. Entrando, era um lugar inesperadamente sofisticado. Caffè Centrale. O cappuccino era excelente. Italianos só tomam cappuccino cedo. Eu tomo cappuccino a qualquer hora do dia, e nunca me falaram nada.

A oscilação entre mato e luxo continuou na saída de Montefiascone. Ainda no clima do café chique, a estrada virou um oceano de galhos caídos. Parecia que haviam derrubado todas as árvores e jogado os restos no caminho. Atravessei aquilo empurrando a bike.

Terrenos variados.

Agora, a maior parte do trajeto era estrada de cascalho. Estávamos em região de morros. O tempo continuava perfeito. Antes de chegar em Civita di Bagnoregio, alcancei Tom e Oliver, que tinham acabado de consertar um rasgo na lateral do pneu. Eles estavam só aguardando para ver se o reparo ia dar certo. Foi a última vez que os encontrei na prova.

Um dos cartões postais do Italy Divide, Bagnoregio é uma vila muito antiga construída sobre um tipo de rocha que vem erodindo ao longo dos séculos, e hoje resta uma espécie de ilha de pedra com casas antigas. Não sei até que ponto as pessoas exageram, mas dizem que é bom ir lá logo, antes que o resto da cidade desmorone.

Civita di Bagnoregio.

O trajeto da prova passa perto da entrada para Bagnoregio. A vontade, claro, é entrar ali e conhecer melhor. Mas essa vontade existe a cada metro da prova. Tomei um sorvete com o inglês Webster, também participante. Não me lembro de nada do que conversamos, mas gostei dele. E também não o encontrei mais.

A surra de beleza tinha começado. Próxima parada: Orvieto. Mais uma cidadezinha nascida de um castelo no topo de um morro. Cada cidade tem sua história, seus detalhes construtivos, seus símbolos e ornamentos. A biodiversidade da Mata Atlântica não tem paralelo na Itália, assim como a diversidade arquitetônica na Itália não tem paralelo no Brasil.

Encontrei um restaurante chinês na entrada do centro histórico. Achei bom variar um pouco a dieta. Em poucos minutos, o tcheco Michal me viu ali e entrou também. Almoçamos juntos. Eu tinha passado por ele na subida, e ele me falou o quanto estava cansado. Falou também que só tinha dormido no bivaque até então.

Começamos a falar de quilometragem, e eu comentei que estava feliz porque já tínhamos algo como 600km cumpridos. Ele me disse um número bem menor. Fui verificar no arquivo da prova, e sim, meu computador de bordo Garmin tinha exagerado meu progresso em mais de 100km. Eu nunca entendi direito o motivo desse erro do Garmin. Por alguns segundos senti um baque, mas eu estava curtindo o caminho e até então não tinha me sacrificado em nada, então não vi motivo para lamentar. Mas a ideia de completar a prova em 6 dias deixou de parecer simples.

Desci de Orvieto me perdendo um pouco pelas vielas. A tarde foi de longas estradas de cascalho em ótimo estado, e subidas razoáveis. Fazendas, rebanhos de ovelhas e ruínas misturadas a construções em perfeito estado. Passei pelo Castelo de Proceno e logo vi uma grande torre retangular no topo de uma serra, à distância no horizonte.

Foi uma longa subida, que foi se transformando em uma duríssima subida. Aquele tipo de estrada de cascalho muito claro, com ciprestes no entorno e colinas até onde a vista alcança, era familiar para mim. O Sol já começava a descer quando consegui chegar na vila daquela grande torre: Radicofani.

Dentro da vila, a sensação de familiaridade aumentou. As cerâmicas e os alimentos expostos nas lojas, os tipos de letreiros, tudo era familiar. Mas foi só quando vi um letreiro dizendo claramente “Toscana” que me dei conta que estava em casa. A região em que me tornei italiano, onde vivi alguns dos dias mais bonitos da minha vida, e alguns dos dias mais difíceis, acompanhando à distância meu pai se recuperando da cirurgia que o salvou mas também tirou parte da sua visão. Ali bateu uma emoção avassaladora, todo aquele tempo de pandemia, depois todo o treino e preparação para percorrer este caminho. Todos os périplos dos meus antepassados que saíram dali e foram parar no interior de São Paulo um século atrás, recomeçar a vida do nada. Todas as loucuras do mundo que forçam o ser humano a emigrar. Lugares maravilhosos que passam por épocas terríveis em que as pessoas enlouquecem e se tornam monstros. Todos os lugares do mundo parecem que são assim. A alegria de conseguir, de chegar ali, meio do caminho, e estar bem de cabeça e de corpo. Sentei em uma praça e chorei.

Chorei mesmo.

Minha vontade era chegar em Siena naquele dia, a fantasia era dormir na Piazza del Campo, a praça central, onde acontece o Palio di Siena. Na cidade seguinte, Bagni San Filippo, a noite vinha e jantei em um restaurante delicioso. Tomei até um vinho, com a ideia de continuar noite adentro até Siena.

No escuro, a sucessão de cidadelas no alto é uma sucessão de esculturas douradas pela luz, que vão crescendo conforme nos aproximamos. Eu estava no Vale d’Orcia, que de vale tinha pouco. Vieram Campiglia d’Orcia, Castiglione d’Orcia, Rocca d’Orcia. Eram quase 10 da noite quando avistei um trio de ciclistas parados na minha frente, conferindo seus celulares. Eram Azubuike, Francesco e Jan. Eles decidiam onde dormir. Estávamos perto de San Quirico d’Orcia, cidadezinha famosa pela sua lindeza. Pedalando ali à noite, eu queria chegar em Siena mas sentia estar desperdiçando o visual daquele lugar.

Decidi seguir com eles para San Quirico e dormir. Essa cidadezinha é mais uma que transcende adjetivos. É uma atrás da outra mesmo, não tem descanso, você não vai ver um troço feio pra relaxar. É só coisa muito bonita fazendo você reavaliar sua existência inteira, e cumpre a você ali tolerar isso, aceitar que isso existe. Não foi nada fácil achar um hotel com vagas. Acabamos num dos melhores hoteis da cidade. Dividi quarto, e cama, com o Azubuike. Antes mesmo de chegarmos no hotel ele expressava o quanto estava exausto, e dizia não acreditar como a gente estava tranquilo depois de pedalar tanto.

Azubuike, Francesco e Jan avaliando onde dormir.
Se um dia vir essa placa, siga por todos os lados ao mesmo tempo. Não tem erro.
Francesco “desenrolando” na recepção.
Vista do hotel em San Quirico d’Orcia.

Dia 5: San Quirico d’Orca—Impruneta

Acordei e o dia já tinha raiado. Hoje eu novamente aproveitaria o café da manhã do hotel. Sábia decisão, pois o café foi em um restaurante ao lado, primorosamente decorado, e cheio de cartazes dos festivais da cidade em anos anteriores. As pequenas cidades da Europa muitas vezes promovem festivais ao longo do ano, de todas as formas de arte imagináveis, e muitas delas produzem cartazes deslumbrantes, que vencem concursos internacionais de design. San Quirico d’Orcia é dessas.

A refeição foi à altura dos cartazes. E como eu já estava com roupa de ciclista, afinal eu nem tinha outra roupa, a gerente do hotel me deu dois cafés da manhã completos, para eu me alimentar bem. Se na Itália o ciclismo é coisa séria, na Toscana, e principalmente de onde eu estava até Florença, ciclismo é quase religião.

Entender como o ciclismo pode ter esse status na Itália tem sido um processo contínuo para mim. Mesmo em anos anteriores que estive no país, nas pousadas é comum ver fotos preto-e-branco de ciclistas antigos em competições. Depois de bastante tempo aprendi que quase sempre as fotos são de Fausto Coppi e Gino Bartali, dois grandes campeões e rivais. Mais tempo ainda se passou e fiquei sabendo do papel importante que Bartali desempenhou na Segunda Guerra: com seu país no auge do fascismo, Bartali atravessava o país transportando documentos falsificados ocultos dentro dos tubos da sua bicicleta. Os documentos enganavam os fascistas e salvaram a vida de dezenas, ou talvez centenas, de judeus do país. O excelente livro “O Leão da Toscana”, de Ali McConnon, conta esta história.

Saí sozinho do hotel e rapidamente estava de volta à estrada. Precisei voltar quase 10 quilômetros para retomar a rota da prova de onde eu tinha saído, e acabei passando de novo por San Quirico.

Eu estava ansioso para ver Siena novamente. Em 2018 nasceram meus dois filhos gêmeos, um menino e uma menina, e esta última quase ganhou o nome de Siena. Ficou sendo Aurora. E hoje, eu entre a aurora e Siena, teria um deleite completo nas Strade Bianche, as Estradas Brancas da Toscana.

Aquelas imagens de cartão postal com colinas verdes, uma estrada alva serpenteando os vales cercada de ciprestes, chegando a um castelo rodeado de vinhas. O resumo é esse. Estando lá, é muito mais. São casas com padronagens em tijolo que só se vê ali, são aromas de jasmim e outras flores que nascem no mato e nas propriedades. São subidas duríssimas de se fazer, curtas mas empinadas, seguidas de descidas delirantes no cascalho mais perfeito que se pode imaginar.

O piso é tão ideal para a prática do que chamamos de gravel biking que ali tem rotas oficiais, demarcada por placas do governo.

Italy Divide 2022 — Antes

25 de janeiro de 2022

No final do post sobre o Bikingman 2022 eu escrevo um pouco sobre minha decisão de participar do Italy Divide. Aqui vou fazer anotações esporádicas sobre minha preparação.

Em dezembro comecei a ser treinado pelo Nuno Lopes. Ele tem uma bela vivência no ciclismo de longa distância, completou a Trans Am e é conselheiro do Randonneurs Brasil. Mal arranhamos a superfície, mas gosto muito dele, me divirto e ele entende do assunto.

Fiz uma primeira consulta com o Rafael Brasilia, conhecido nutricionista de ciclismo. Desde então perdi uns 2 ou 3 kgs, dos 84 passei pra 82 ou 81 (cheguei a pesar 80.0 na balança logo após um pedal…sei que não vale mas foi marcante). Tenho me alimentado de maneira bem diferente do habitual. Não é fácil mas o resultado aparece aos poucos, e a construção de novos comportamentos leva bem mais de 2 meses.

Estou trocando de bicicleta. Minha gravel atual, uma Topstone de carbono, não comporta pneus mais largos que 38, talvez 40mm em rodas 700C. Na Topstone eu venho usando uma roda 650b, e assim pneus 48mm, mas pneus para rodas 650 são impossíveis de encontrar em lojas. Depois do rasgo no pneu durante o Bikingman, optei por essa troca (e é claro que nunca mais vou ter esse problema com o pneu).

Comprei alguns equipamentos para o Italy Divide, e outros estão a caminho. A melhor compra até agora: um farol Ravemen 1600 lumens. Fiz um brevet de 1000km que pensei como preparação. E que preparação: choveu o tempo todo, as estradas ficaram bem perigosas no final, perto de Mariana e Ouro Preto. Fiz 950km e abandonei, com as solas dos pés bastante machucadas pela água e pensando na minha segurança naquela estrada.

Meu objetivo para o Italy Divide é completar dentro do tempo, aproveitando ao máximo o trajeto que promete ser muito difícil. Até agora eu não sei qual o tempo máximo permitido para se completar o Italy Divide. O site e o manual da prova parecem bastante vagos a respeito, mas já vi relatos falando em 7 dias. 1250km com 22000m de altimetria em 7 dias parecem factíveis, mesmo sabendo que o terreno vai ser bem desafiador.

Links

https://off.road.cc/content/feature/conquering-the-1300km-italy-divide-8527

My Year at: Work

The last episode in our adventures ended with me as a Team Lead at Circuit, and me calling this article “My Year in: Tech”.

From now on I will use a more encompassing “Work”. 2021 was a year of important steps towards a goal I’ve held for a few years now: to become a full-time investor in the general style of a Warren Buffett and a Ben Graham.

I started the year helping spawn a new team at Circuit, the first official team there. We were happy to welcome two engineers, Christian Kaisermann and Vitor Paladini, who truly hit the ground running. They had worked together before, and their rapport made things move from the beginning.

Around April a friend whom I admire very much, Bruno Bergher, told me about Metabase, a company he had recently joined as VP of Product. Metabase does BI and data visualization. The product seemed quite nice, the company had a good online reputation, and I could imagine that the domain was interesting. Most of all, Bruno is really one of the smartest people I’ve had the luck to meet.

Bruno asked me if I’d consider a position at Metabase. I was satisfied at Circuit: the people were really nice, the work flowed well and the company was soaring, having grown revenue 3 times last year while almost entirely bootstrapped. There were two issues for me: working with Firebase, something I touched every day, was not enjoyable, and judging by the company setup, getting a pay raise would not be trivial. I brought up both subjects, Firebase multiple times, and salary a couple of times. The outcomes of those conversations were understandable from Circuit’s point of view, but didn’t point towards a great convergence with what I preferred.

It seems to happen repeatedly in tech, at least in our long-standing economic cycle, that companies focus on recruiting but not on retaining. Although this did not happen so literally at Circuit, we often see professionals start jobs at much higher salaries than great people who had joined a company months or years before. The churn seems suboptimal from a long term perspective, for everyone involved. As it happens, from the perspective of an employee, joining a different company means you will earn much more than staying put.

Long story short, in May I joined Metabase. Again I went from leading to being an engineer.

In parallel, and I had being working on this for over a year, I kept studying for the Brazilian equivalent of the CFA. Here we call it CGA. Mid-year, I passed. This certification opens the legal doors for me to manage investment portfolios, funds and so on. Investing is something I started reading about in 2007 or 2008, and it became a serious pursuit for me. To illustrate, I have a YouTube channel where I study companies in public, and I’ve done over 730 episodes of it. I started a very informal investment partnership in 2017 that has been beating the most important Brazilian stock index since inception. It’s something that I’ve frankly been enjoying much more than software. It may be because I only have an hour or so a day to dedicate to it. The fact is, it’s going well and I love to work on a much, much wider canvas than the one I see in software.

The experience at Metabase has felt peculiar and is still hard to describe, even after 8 months. It’s a very loose organization that has grown its headcount a lot recently. I don’t get to work with Bruno directly. The codebase and processes have been a challenge for me, and I’ve worked on a few challenging codebases and processes. It feels like I still haven’t understood the company enough to be able to describe it. I am thankful to be there, but must admit I miss working with a bit more structure, and I certainly miss the more frequent human interactions and strategic work of leadership and management.

I have one very clear goal for 2022: to start a formal investment partnership. It will take the shape of an investment “Club,” a legal vehicle in Brazil that is suitable for investment funds that are still not large, between 1 and 15 million reais. I will be able to, indeed must work on it only part-time —as a shareholder in the fund, by law I can’t be paid to manage the portfolio. This will be a very important step in growing a currently informal partnership that has beaten the Brazilian stock index by 61.38% over the last 5 years into a true investment fund a few years from now. If you are reading this and would like to know more about investing with the partnership please write me at gustavo@poe.ma.

My Year in: Tech

I started out 2020 taking my first relatively prolonged vacations of the last 15 years or so: 3 weeks. Coming out of the first year of my twin children, the break was welcome.

To recap, I was working at Toptal’s core and had just finished recruiting a new team, having hired 3 new front-end engineers. I put myself in contention for a promotion to Engineering Manager. At Toptal this was a rarefied position. The company was about 600 or 700 people and only 4 EMs existed. They were opening 4 new spots. I was looking for a step forward, not necessarily associated with a title.

Almost parallel to that, a former colleague tweeted that his company, Circuit, was looking for people. I really love this guy, Filipe Alvarenga, so any company he’s working for must have virtues. I met Jack Underwood, one of Circuit’s founders and its CEO. I felt good about him and the company. It helped that Jack publishes monthly letters to the public about how the company is doing, and they seemed very candid.

Circuit provides technological infrastructure for last-mile deliveries. Think managing your daily routes if you are an individual driver, and also doing that in a team of dozens of drivers.

I was hired at the Team Lead level, same as I had been at Toptal. The idea was to expand the front-end headcount at Circuit and create a React team. When I joined, in the second half of March, the world had just been turned upside down by Covid. All plans at the company changed very quickly: despite the immense negatives of the pandemic, Circuit was in a position to help things and grow significantly, as deliveries exploded everywhere.

I operated as an engineer for the rest of the year. In my first 2 or 3 weeks I wrote an application where recipients of deliveries could track their shipments. It was relatively simple, and got shipped quite smoothly. That was the first application written in React at Circuit.

The company’s focus had shifted to really serving teams of drivers. It’s a natural progression from individual drivers, to teams, and eventually to enterprise.

Our back-end uses Firestore, a serverless product from Google, and there was work to do there after completing the recipient application. I shipped or helped ship several of these cloud functions, both for external and internal use. What was missing in our backend were tests. A colleague had just started writing unit tests in the repo. I spent weeks of off-time trying to learn how to properly test back-end functions in Firestore. The documentation is not helpful and I could not find good materials. So I pieced out the knowledge, tried things, and eventually got one version to work, then we all improved on it. I think this was our main achievement of the year, technically. Soon the tests spread out in the app, all colleagues were writing tests, and I believe we got a much more productive rest of the year with the benefits of serious test coverage.

After some work converting our internal admin panel to React, we took on the rewrite of SpeedyRoute.com, also in React. SpeedyRoute is an acquisition made by Circuit some time ago, originally written in CoffeeScript. We completely rewrote it in React, and now the UI looks a bit more contemporary too. Around then the decision was made to convert all our web applications to React, and to start the new ones in React as well, phasing out Ember.js.

At this point, we were in the last quarter of 2020 and we were ready to go back to the original plan for my joining Circuit. Jack invited me to lead the recruiting of 4 front-end engineers. It was great to be back doing interpersonal-focused work. The internal recommendations of engineers were very strong and this helped the process move quite quickly. We now have 3 hires and may close out the 4th soon.

The newcomers will start in the first few weeks of January, and we will spawn a team to rewrite our most important web client, Circuit for Teams.

The year was challenging, of course, but at work it did not feel proportional to a global pandemic. The culture at Circuit is driven but very balanced, the founders are sensible, very intelligent, and rational. They are always present, designing and coding along, so it feels they get a much more realistic sense of how things are progressing than if they were only doing management. And because they are working with everyone, it is just natural that we can talk frequently and issues get resolved quickly.

The company more than tripled its annual recurring revenue from US$3M to just over US$10M this year. There were next to no major bugs or incidents, and a lot got done during the year. Interactions with everyone were unfailingly pleasant and constructive.

I was the 8th person in the company when I joined, we are now 12 and, with the new team, will be at least 16 in the first quarter of 2021. It will be fun to help grow the company, help keep the good things that can be kept of the current structure, and also help add good things for it to scale nicely. We have reasons to be optimistic that Circuit will accomplish this.

TDD with Firestore functions emulator

Having spent time running tests inside and outside Firestore’s emulator, I learned that using the emulator is more than 50% faster.

Here is the latest flow we are using at Circuit. If you know of a simpler way, please let me know at gus [at] getcircuit [dot] com.

Basic version

firebase emulators:exec --only firestore 'jest'

You can replace jest with the runner of your choice.

Abstract the emulator call

Install scripty:

yarn add scripty

Add an entry to package.json:

{
  …
  "scripts": {
    …
    "test": "scripty"
  }
  …
}

Create a directory called scripts in the root of your project.

Create a file with path and name scripts/test:

#!/usr/bin/env sh

str="$*"
firebase emulators:exec --only firestore "yarn jest $str"

Allow computer to run this file:

chmod 644 scripts/test

Now you can run yarn test and add anything you would add to the command, like yarn test --watch, yarn test /path/to/test.file.

Enable connecting with a browser’s debugger

Add an entry to package.json:

{
  …
  "scripts": {
    …
    "debug": "scripty"
  }
  …
}

Create a file with path and name script/debug:

#!/usr/bin/env sh

str="$*"
firebase emulators:exec --only firestore "node --inspect node_modules/.bin/jest --watch --runInBand $str"

Allow computer to run this file:

chmod 644 scripts/debug

Add debugger to any line of your Firestore code.

Run yarn debug — you can also pass a filename to focus on it right away.

Open your browers’s developer tools.

Click on the green cube (Node’s logo):

This will open the debugger and you’re ready to step debug your code.

Simple tips for applying for a new development job

For several years, recruiting has been a part of my job in software. A few times I’ve been on the other side, looking for a job myself.

There are many low-hanging-fruit-type tips that can really make a difference when we look for a job. By making mistakes myself, seeing them made while recruiting, and by talking to colleagues, it’s now possible for me to list a few. Some may seem obvious to you — if you haven’t yet recruited, you’re in for a surprise over how common they are, and how much they affect the chances of someone getting a great job.

Learn about the company first

Before starting your application, spend no less than an hour attentively studying the company. Go to YouTube, try to watch videos involving top leadership. Read articles and learn about the people there.

Apply only to companies you care about

If you are in full application mode, apply to no more than 3 companies per day. Ideally 1 company.

If the company’s purpose doesn’t resonate with you, recognize the fact and move on.

Look at companies’ careers pages

Several companies, often the best ones, don’t advertise open jobs. They have their own careers pages and, relying on their reputations, will wait for applications.

For people who like to work remotely, Remotive’s company list has been helpful to a few people I know: https://remotive.io/remote-companies.

Don’t wait to apply

Once you’ve learned about a company and feel enthusiastic about it, apply immediately. In the global development market, good companies receive hundreds of applications on the first day or two after they post a job.

Apply to many jobs

While not applying to just any open job, do apply to as many of them as you truly like. Statistically, odds are low that you will be called for one given opportunity.

Start early

If I am suggesting you do not apply to too many positions each day, but to apply to many positions, by consequence I am suggesting you start early in your job search. Maybe practicing going through recruiting processes even before you need or want to do it can be ideal.

No spelling or grammar errors

Make it perfect in the language the company operates in. Pay someone, or a service, if needed. Great companies will quickly screen out applications that have language mistakes. By writing minimally well, expect to go to the top 10% of all applications.

Add a Github link to your CV

This is a huge differential. Prefer Gitlab or Bitbucket? Great, use your favorite. Don’t have public repos? Add repos of things you study, it’s perfectly fine. Make sure you add very good READMEs enabling visitors to run and test your repos.

Nothing like relationships

All the above may not be necessary if you have good relationships with former colleagues. You may be sought out before you need to look for a job. For this to happen, it is not enough to be very proficient at the technical part, people have to like spending time with you.

Git basics while typing less

Very short git commands

As computer programmers evolve in their craft, they increasingly identify repetitive tasks at all levels. One of the most basic levels is typing on the keyboard. Some programmers choose to invest effort and minimize typing. I am one of those people.

Git commands are among the ones I use the most, as listed in decreasing order with the number of times for each:

1241 gc
637 gco
583 v
419 git
373 cd
368 rm
316 mv
302 yarn
299 gb
247 gto
215 ga
213 c
191 gst
160
136 bundle
124 ©
115 mkdir
114 cp
106 npm
106 gt

If you’d like to see yours, you can run the following on the terminal: history | awk 'BEGIN {FS="[ \t]+|\|"} {print $3}' | sort | uniq -c | sort -nr | head -n 20

Please note that the number 20 at the end is the number of results to retrieve.

Back to my own history, you can see that:

  1. I use a lot of aliases
  2. Most of them are git-related, and that’s why they start with a g; gc is git commit, gco is git checkout and so on.

Recently I have taken this to the extreme, and so far the results have been excellent. Below are the commands I am able to run:

c (git commit or git commit -m, depending on the args passed)

p (git push)

a. (git add .)

b (git checkout -b)

The c function works for the following cases:

  1. c (will open the text editor for a long commit message)
  2. c “Your commit message” (acts as an alias for git commit -m
  3. c Your commit message (the one I love as you just type c plus the message, and it works)

While p and a. are calls with no args, with b you must simply add a branch name.

These are extremely simple improvements to the flow, and together with many others that I created or that I use from libraries, they make the path from brain to computer shorter and more pleasant.

To see how these are implemented, please visit this gist: https://gist.github.com/gusaiani/70736c970c2b2d4020006eb7dd31bc40

The commands in the gist which are not defined in this file come from oh-my-zsh plugins.

My Year in: Tech

I started the year of 2019 as a front-end developer at Toptal’s core team. Just a few days later, I was invited to be Team Lead for a brand new team.

My emphasis turned, again, to working with people. That was a delight and I fully embraced the opportunity to help build a team. We had a few company veterans enlisted to start the new team, all of whom I had not worked with before, and we needed to hire two more front-end engineers.

The first recruitment process was for an excellent React engineer. It was done very deliberately and unhurriedly, to make sure we raised the overall level of the team on the React stack. It took us a little over 2 months until we found a great guy, who has contributed a lot this year.

The second engineer was a gift to us, as he was initially hired for another team. Happy to say he’s also doing tremendously well.

We quickly became a real team. It seems we did a few things that helped: communicating a lot, admitting mistakes and ignorance openly and quickly, and being real human beings.

One teammate brought along the Personal Questions call from his previous team. This call has a simple structure: one team member asks one or two questions, personal as the name says, to everyone on the team.

The questions are as simple as “What was the best trip you ever took?”, or “What is your favorite dish?”. It’s up to the team to let this call become just a little window on who they are, or a huge gateway to people’s souls. Yes, it’s possible to cry while listening to someone tell you about their favorite food once they tell you the story behind it. The bond I felt with the team was immense.

Dedicating at least one or two hours per week of each team member’s time to building rapport makes a big difference, particularly in new teams. Next year I will work to learn more ways of doing that.

I made my share of mistakes. The one that comes strongest to mind is about having patience before giving feedback to people you may like personally but don’t think are doing a good job — especially when they are not reporting to you. Convincing people to change is hard enough as it is, doing it without mutual trust and knowing their motivations is likely to backfire.

Another lesson I was reminded of by a mistake of mine is the “no surprises rule”. It’s often hard to know, in advance, how sensitive some task or decision may turn out to be. Next time something I do starts to deviate too much from what was agreed-upon, I should remember to share that early on, and avoid surprises, because the surprise itself may make people react negatively to something fundamentally desirable, or I may have the wrong assumptions or decisions and other points of view will help me see that.

I stayed with the team for a total of 9 months, we launched a good chunk of the new application we were developing, and then I was enlisted to start a new team from scratch: to recruit every single engineer, and help recruit designer and product manager.

It was painful to say goodbye to a team I loved so much.

Soon it was back to recruiting, this time a few weeks of full-time effort, and we are still at it. We seem to be close to hiring two people, and have one more front-end and one more QA person to bring onboard on the engineering side.

This recent team switch gave me time to study programming after a several-month hiatus. I am focusing on new React APIs, from Hooks to Context and Suspense, as well as testing, TypeScript and, soon, Apollo.

I did continue to study the Elixir language source, something I’ve done for maybe 3 years now. This year I did relatively little of it. I love Elixir just as much as always, and am thankful for having learned so much from its community.

I plan to go multi-team as soon as I have a chance, be it in an Engineering Manager or CTO role. Thus I dedicated more time than ever to reading about leadership, management and communication, often with a big emphasis on tech. Especially for people who are new to management, I recommend The Making of a Manager by Julie Zhou.

A personal take on interviewing programmers

A few months ago some members of the team I lead at Toptal’s core team started interviewing programmers.

The fundamental questions that popped up were simple and deep: What should I look for in the interviewee? How do I know I should pass or fail the person?

I really like the priorities my own former supervisor, Timo Roessner, advocates: to look for—in decreasing order of importance—a team player, a good communicator, and a technically excellent person.

The person should ideally be very good at all 3 requisites. The main point, however, is deemphasizing technical wizardry in favor of interpersonal skills.

How to assess team-playing chops in a 90-minute interview with a coding challenge

Team-playing chops and communication chops seem intermingled, and in fact I believe one potentializes the other, but they can be assessed quite separately in software engineers.

As you facilitate a coding challenge or nearly pair-program with the interviewee, try to make it as close to the interviewee’s normal workflow as you can. Don’t use CodePens, have the interviewee use the editor or IDE of her preference. Apart from the technical things you need to evaluate her on, encourage her to use her favorite tools and procedures.

What you need to evaluate the candidate on is up to the needs of your company or team, but in general I prefer to give the candidate a wide-open small project instead of some algorithmic or procedural task. The reason is you will get a chance to role-play being the customer or Product Manager, and you can talk to the interviewee as such and see if she is able to conduct a dialog like this.

Calibrate, as you go along and get a sense of the candidate, how high-level or low-level it’s better to be. That is, is this person more concerned about the coding nitty-gritty or about what the entire project should do? Both are fine and necessary programmer inclinations, but the quicker you spot the candidate’s preferences, the quicker you can develop a rapport.

As the coding challenge starts, pay attention to the questions and shared thoughts. It should be clear to you, given some experience, if the candidate has mileage or a willingness to openly express thoughts. If they don’t say anything at all, probably this person will behave the same way at work.

Avoid, or delay, “helping” the candidate. Generally, in a coding challenge lasting 1 hour, I may interfere 1 to 3 times. But when you do, try to make it very meaningful and make it so that the proposed change of course really takes things in a different direction.

For example you propose the programmer develop a simple game. She starts by crafting the algorithm that will define if the game is over. As the interview goes past half its allotted time, and if the candidate has shown a good direction regarding the solution, propose she create the UI (if she is a frontend developer), or suggest creating a way to store a leaderboard (if she is a backend developer).

The way the candidate reacts to such proposals can be telling of a team player.

Also, very often candidates will do or say things that you don’t know anything about. Tell them you don’t know anything about that and see how they react. Do they explain it to you? Are they surprised? Do they convey a sense that they respect you less for that? But don’t pretend you don’t know something you know—you don’t need any trickery to interview people well.

How to assess communication chops

Assessing communication skills is a bit easier than assessing team-player inclinations. Start with the basics: can you even understand what the interviewee is saying? Often that is not the case. If and when you don’t, tell them that in a gentle way. This happens particularly often in international interviewing when spoken languages are not native to you or the candidate.

The opposite can happen: the candidate does not understand you. You should, of course, try your best to communicate clearly, and if the candidate still has a hard time getting what you are saying or asking, notice if they have the energy to ask you to clarify. If so, that is a good sign.

Being able to listen deeply is what differentiates an ok communicator from a good or great one. Does the candidate flow from what you are saying? In other words, can you notice them using and reshaping pieces of your discourse? Repeating things back to you transformed? Those are good signs. If they just respond things that seem unrelated to what you have been saying, then clearly this is a minus. More often things fall around the middle, and with time you will develop a feel for how good the candidate seems to be, plus the courage to use your intuition when the decision is not clear-cut.

How to assess programming chops

This is the easiest part if you yourself are a programmer, but it’s still challenging sometimes. Granted, it’s easy to reach a conclusion in extreme cases: if the candidate did really poorly or just brilliantly in the coding part.

When things fall more in the middle, which is by far the most typical, your skill can make a huge difference in the decision to say Yes or No to a candidate.

I always like it when a candidate writes, in human language, something like a list of things that need to happen in the program. For example, if the proposed task is to build a search user interface: to jot down that the screen has an input and a submit button, the user will type a string in that input, then press the submit button, and so on. This helps the candidate “think like a computer”, it allows her to expose her thought process to the interviewer and, if her assumptions are off-base, to know early. The worst that can happen is to end up with a little algorithm of what to code.

TDD, or anything similar to that, is a huge positive differential. It is a kind of planning ahead.

I must say it’s very rare that anyone uses TDD in interviews I run, and I’ve run a few hundred of them at the very least. It has never ever happened that a candidate wrote down point by point what should happen in the application.

Finally, good code architecture early on is one of the strongest signs that the candidate is good. If they refactor continuously, improve variable names often, and order things in their codebase without losing their train of thought, you are looking at a hire. And that’s why giving people much harder tasks than they will face in their work is typically not a good idea: you need to see how they can make code understandable to fellow programmers.

So if they start one file and fill it up with disorganized, commented out code and huge blocks of attempts, unless you asked them to do something too hard, in general consider this as a potential flag. But don’t get stuck to this: it’s not uncommon for great developers to seem quite sloppy the first 15 minutes in, and 10 minutes before the hour, to start deleting code and apply a final layer of improvements that leaves the code looking quite wonderful.

If you give the candidate a project that is larger than the hour you have to interview, something I support you do—as long as you set the right expectations, otherwise you will have a frozen person in front of you—, and you enabled the candidate to own the code in her machine, the bonus point is them continuing the project on their own. Until recently I sometimes suggested they do it. Nowadays I don’t even suggest that. If they have a way to reach me, they can do it if they want. I certainly take it as the strongest sign of interest in the part of the candidate if, hours or even a couple of days later, they get in touch with the completed project.

Participating in Daily Standups



Purpose of Daily Standups


You should leave a daily standup:

  1. More energized than you entered it.
  2. Aligned to be in contact after the daily with anyone if your or their main task needs discussion.
  3. Remembering everyone’s update.

Things outside of Daily Standups that can ruin Daily Standups

  1. If team communicates 1-to-1 a lot and not on shared channels.
  2. If people are tackling too many things at the same time.
  3. All basic management deficiencies.

How to prepare for a Daily Standup

Half an hour before the Daily Standup, stop for 5 minutes and:

  1. Decide what is the one initiative you will mention.
  2. Write it down in your own words.
  3. Edit that down to 280 characters.
  4. Include expected time to finish task at the end.
  5. Say it aloud.
  6. Improve the wording or delivery until you have a clear and memorable update.

How to decide what to mention in a Daily Standup

By decreasing order:

  1. Task you are doing that is most problematic.
  2. Task you are doing that you know someone can help you with.
  3. Task that is going well.

How to listen well in Daily Standups

  1. Keep a log of Daily Standups and make notes of every update.
  2. Come back to that log half an hour after the daily and read it again.

Trusting the Scrum Master in Daily Standups

If each team member delivers their update clearly, nicely and concisely, the Scrum Master will have time to:

  1. Ask about important items that were not selected by the team.
  2. Raise questions.
  3. Ask about extraordinary additions to people’s update.
  4. Align people for pairing on issues raised.
  5. Use the extra time for having a bit of fun and enjoying the team before it gets back to work.